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Crônica - Frei Tito entre o silêncio do homem e de Deus - Manoel Messias Pereira

 




Frei Tito entre o silêncio do homem e de Deus


Hoje lembramos que no dia 4 de novembro de 1969 - Frei Tito de Alencar era preso juntamente com outros religiosos, num Operação policial da ditadura Civil e militar chamada de "Batina Branca" e o religioso foi torturado nas dependências do DOPS em São Paulo.

Em 10 de agosto de 1974, em que os moradores de Lyon na França encontraram o corpo de Frei Tito Alencar Lima pendurado numa árvore, enforcado com uma corda. E as autoridades locais constatou que o religioso havia suicidado. Este ato com certeza nasce num momento de desespero, num momento de dor, pois o próprio suicídio é condenado pela Igreja Católica Apostólica Romana, que ainda hoje ensina que  não somos proprietários de nossa vida e sim Deus, por isso não podemos por fim nela. E ainda afirma que o suicídio contradiz a inclinação natural do ser humano a conservar e a perpetuar a própria vida.

Pouco antes de sua morte ele escreveu "São noites de silêncio. Vozes que clamam num espaço infinito. Um silêncio do homem e um silêncio de Deus".

Mas diante deste fato que já decorre quarenta e cinco anos observamos que Frei Tito foi vítima trágica da ditadura civil e militar brasileira, também conhecida como período ou anos de chumbo que vai de 1964 a 1985. Vale lembrar que ele encontrava-se na França exilado em um convento nas colinas da vila francesa de L' Arbert desde 1973. E após ter sido preso, torturado, tendo para tanto a necessidade de ter passado por um tratamento psiquiátrico ele dizia que ouvia vozes de Sérgio Paranhos Fleury, que estava torturando irmãos e que prometera que iria terminar a tortura pela mão de Tito. E para chegar a esse Estado desesperador de medo correndo e escondendo atrás das árvores é preciso detalhar um pouco a vida e o que passou durante esse período histórico esse religioso.

No Brasil a Comissão Nacional da Verdade, criada pela Lei 13148 de 16 de julho de 2015 e que foi publicada no diário Oficial da União em 17 de julho do 2015, que concedeu a pensão especial aos herdeiros de Frei  Tito de Alencar Lima. 

Frei Tito é natural de Fortaleza nascido em 14 de setembro de 1945 e estudou no Liceu do Ceará. Em 1962 foi escolhido como dirigente regional para o nordeste da juventude estudantil católica - JEC. Foi morar no Recife. E ingressou no noviciado dos dominicanos em Belo Horizonte e em 1966 fez a profissão dos votos e no ano seguinte veio morar em São Paulo. Onde veio estudar filosofia na Universidade de São Paulo USP.

E em 1968 participou do Congresso clandestino da União Nacional dos Estudantes-UNE em Ibiúna e acabou sendo fichado pela polícia e tornou-se alvo da perseguição do regime. E em 4 de novembro de 1969 foi preso juntamente com outros dominicanos pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury do Departamento de Ordem Política e Social - DOPS. Nessa ocasião, foi acusado de manter contato com a Ação Libertadora Nacional -ALN e o comunista  Carlos Marighella. E neste episódio Frei Tito relatou ter sofrido torturas durante  trinta dias e depois disto enviado para o presídio Tiradentes, local onde permaneceu até 17 de dezembro.

A sua narrativa de dor, consta que foi levado para a sede da OBAN, como era chamada a Operação Bandeirantes, local chamado pelo torturador Maurício Lopes como sucursal do inferno. E ali foi submetido ao pau-de-arara, choque elétrico na cabeça e nos órgãos genitais,nos pés, mão nos ouvidos, levou socos, porretadas  e palmatórias, durante o tempo  48 horas . Além de ter sido colocado na cadeira do dragão e queimado com cigarros. Ainda no presídio cortou-se com lâmina de barbear precisou de atendimento médico, no hospital do Cambuci. Devido a torturas sofridas escreveu um documento que acabou ganhando o mundo e transformou em símbolo de uma luta pelos direitos humanos. quando ele ia para o Oban  ficava sob a responsabilidade do juíz auditor Nelson Guimarães, que autorizava a sua saída e soube mais tarde que essas idas era com garantia de integridade física.

Entre os torturadores estava o capitão Benoni  de Arruda Albernaz, que dizia que quando ia para a Operação bandeirantes deixava o coração em casa e que tinha verdadeiro pavor de padres, e juntamente com outros militares gritavam quem eram os outros padres terroristas. Além dos choques ofendiam a Igreja, com nomes de baixo calão. e tito teve a boca toda machucada, teve os testículos esmagados. E voltava a pensar no Novo testamento em Mateus para ter forças "O pai exige o sacrifício do filho como prova de amor aos homens, .Desmaiei envolto a dor e febre".

Em 13 de janeiro de 1971 ele foi deportado para o Chile sob a ameaça de ser preso novamente. Fugiu para a Itália. Em Roma há quem diga que não encontrou  o devido apoio da Igreja Católica. E foi chamado de Frei terrorista. Foi para Paris, e lá sim recebeu o apoio dos dominicanos. E assim traumatizado pela tortura recorreu a um tratamento psiquiátrico.

O convento de Saint Jacques, localizado em Paris abrigou Frei Tito até 1973 e lá passou a estudar na Sorbone. O tratamento psiquiátrico não foi suficiente para restabelecer a sua sanidade. Foi enviado para o convento dominicano de Saint Marie de la Tourette em Eveux. Encontraram um dia no meio da chuva correndo assustado e escondendo-se por traz de uma árvore. E afirmava que Fleury não deixava entrar no convento. E este estado de coisa aumentou a preocupação do Frei Xavier Plossat. Quando moradores vão encontrar o seu corpo enforcado numa árvore.

Foi enterrado inicialmente no convento Saint Marie de la Tourette em Eveux. Em 25 de março de 1983 seu corpo chegou ao Brasil. Passou por São Paulo onde teve uma celebração litúrgica e seguiu para Fortaleza.

 D. Paulo Evaristo Arns repudiou a tragédia e em missa de corpo presente foi acompanhado por mais de quatro mil pessoas. Sendo que a missa foi celebrada em trajes vermelhos usado na celebração de mártires.

Tito sabia que o que ele passou não foi exclusividade dele, mas de outros irmãos cristão ou não. Outros seres da mesma espécie que teve que ser dilacerados em dor. Quando muitos morreram na própria tortura. Mas uma hora ele se viu diante apenas do silencio do homem e de Deus. E entre a dor e a reflexão não viu uma saída se não a rápida ida junto ao Criador numa busca de perdão eterno. Ou na falta da luz  lúcida da vida humana  preferiu à morte na busca do reino do céu.

Manoel Messias Pereira


professor de história, cronista e poeta
Membro da Academia de Letras do Brasil -ALB
Membro do Coletivo Negro Minervino de Oliveira
São José do Rio Preto -SP. Brasil








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