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Unesp - desejo do Brasil de encontrar alternativa ao dolar

 

Desejo do Brasil de encontrar alternativas ao dólar para comerciar com BRICS esbarra em oposição americana, dificuldades operacionais e desinteresse, diz professor da Unesp

Economista explica processo histórico que levou moeda americana a se consolidar como única referência para trocas econômicas, impulsionado por antiga vinculação com o ouro e pela ascensão dos EUA como potência após a Segunda Guerra. “A China, que possui grandes reservas em dólar e superávits enormes com os demais países, não demonstra interesse em mudar esse sistema agora”, diz.

O anúncio do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de que irá impor tarifas de 50% a todos os produtos brasileiros importados pelos EUA a partir do primeiro dia de agosto dominou a pauta da mídia nacional esta semana. Para explicar sua opção por uma decisão política tão agressiva contra uma nação com a qual, na verdade, os EUA possuem uma balança comercial favorável, Trump se manifestou em diferentes momentos e por meios diversos. Na postagem nas redes sociais em que anunciou as tarifas, em 9/7, mencionou o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e problemas com a balança comercial. Porém, em entrevista concedida na Casa Branca em 18/7, mencionou seu desagrado com os debates sobre a criação de uma moeda alternativa ao dólar a ser usada para comércio entre os países integrantes do BRICS. O tópico foi levantado durante a reunião do bloco ocorrida no Rio de Janeiro, no início de julho.

Na entrevista, Trump declarou: “Temos esse pequeno grupo chamado BRICS, que está desaparecendo rapidamente. Mas os BRICS queriam tentar dominar o dólar, o domínio do dólar, o padrão do dólar. E eu disse: qualquer um que esteja no consórcio de nações do BRICS, vamos tarifar vocês em 10%. Eles tiveram uma reunião no dia seguinte, e quase ninguém apareceu. Eles não queriam ser tarifados, é incrível”, disse. Sequer foi a primeira vez que abordou o tema em tom tão ameaçador. Em uma postagem feita em janeiro, Trump foi ainda mais duro: “Vamos exigir um compromisso desses países aparentemente hostis de que eles não criarão uma nova moeda nem apoiarão qualquer outra moeda para substituir o poderoso dólar americano, caso contrário, eles enfrentarão 100% de tarifas e deverão dizer adeus às vendas para a maravilhosa economia dos EUA”, escreveu.

Mas por que países cuja pauta comercial alcança as centenas de bilhões de dólares, como é o caso do Brasil e da China, não conduzem sequer uma fração de seu comércio empregando suas moedas nacionais, preferindo utilizar a de um terceiro país? O que os impede? E por que a mera discussão de uma opção alternativa resulta em uma reação tão irada? O professor do Departamento de Economia da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp, câmpus de Araraquara, o economista André Corrêa, explica como se deu a formação do sistema mundial de comércio e por que o dólar se estabeleceu como moeda planetária.

Correia explica que, ao longo do processo de desenvolvimento das economias capitalistas e da estruturação do sistema financeiro mundial, houve diversas referências de valor empregadas entre os comerciantes de diferentes nações. “Houve momentos em que era possível fazer pagamentos envolvendo ativos que estavam ligados ao preço do ouro e da prata, por exemplo. E, em certo momento, a libra inglesa passou a servir como esse ativo de referência mundial, ligado ao ouro”, explica.

A preferência do comércio internacional pela libra inglesa no passado refletia também o caráter dominante da Grã-Bretanha, que, a partir do século 19, se firmou como maior potência militar e econômica do planeta. Foi só no século 20 que perdeu sua dominância global para outra nação: os Estados Unidos. O país não havia sofrido qualquer destruição de seu território durante a Segunda Guerra e encerrou o conflito com crescimento econômico e grande poderio militar. Graças a essas condições, pôde emprestar grandes quantidades de dinheiro para reconstruir a Europa, por meio do Plano Marshall. “Quando veio a necessidade de reconstruir os países que haviam sido devastados pela guerra, foram feitos vários acordos econômicos, e neles se adotava o dólar como a moeda de referência. Na época, o valor do dólar estava atrelado ao do ouro, assim como ocorrera com a libra no passado”, explica.

Na década de 1970, o governo dos EUA decidiu romper a relação entre o dólar e o ouro. Porém, já havia tanto dólar circulando na economia mundial que a mudança não diminuiu o apetite pela moeda americana. O status dos EUA como maior potência militar, econômica e tecnológica bastava para assegurar a confiança do mercado.

Correia explica que a possibilidade de ser o único emissor da moeda de referência do comércio internacional garante a qualquer país um poder muito grande. “Essa é outra forma de exercer o poder, por meio financeiro. O poder não vem só das bombas. Uma das razões para a decadência da Inglaterra como potência está ligada ao fato de que sua moeda deixou de ser a referência principal. É um poder econômico inimaginável. Os Estados Unidos podem emitir dívida em dólar, os outros países não têm essa possibilidade, diz.

Nem o surgimento do euro, outra moeda forte, representou qualquer ameaça à hegemonia do dólar. Vale lembrar que, entre os dez maiores parceiros comerciais do Brasil, estão países que têm como moeda o euro, caso de Holanda, Espanha e Alemanha. O economista explica por que o euro também não é usado no comércio mundial e destaca a crescente financeirização da economia e o caráter global das grandes empresas. “Às vezes, uma empresa francesa, por exemplo, tem compromissos financeiros para cumprir na Ásia, na Europa, no Brasil. Neste mundo tão integrado, é difícil substituir o dólar como moeda de referência, pois toda essa integração foi assentada em torno do dólar.”

Por fim, ele cita o desinteresse em buscar alternativas, manifestado inclusive por integrantes do BRICS, como a China. “A China registra superávits enormes com o restante do mundo e possui um grande estoque de reservas em dólar. Ela nunca apostou abertamente contra o dólar e não sei até que ponto, a curto e médio prazo, estaria disposta a mudar.”

Ouça a íntegra da entrevista ao podcast Unesp.

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