Zuzu Angel a "Angélica"
Era o dia 5 de junho de 1923, quando na cidade de Curvelo, nascia Zuleika Angel Jones, que ficou conhecida no Brasil e no exterior como Zuzu Angel. Na cidade de seu nascimento não sei se há uma praça, ou uma rua ou escola que tenha sido assim homenageada. Mas na memória da história do Brasil é uma figura histórica, que jamais será esquecida. A data de 1923 foi encontrada por mim no livro "Breve História do feminismo no Brasil" escrito por Maria Amélia de Almeida Teles. Pois há informações encontradas que diz que ela nasceu em 1921.
Zuzu foi casada com Normam Angel Jones um americano, e teve o filho Stuat Jones, um militante do MR-8, que quando estudante acabou sendo preso e assassinado pela repressão da ditadura civil e militar estabelecida no Brasil desde 1964, com a aplicação da Operação Brother Sam. E outra filha foi Hidegard Angel, jornalista brasileira.
Embora tenha nascida em Curvelo-MG, mudou-se cedo para a capital e foi em Belo Horizonte -MG, que morou em toda a sua adolescência e mudou-se para o Rio de Janeiro no ano de 1947 e lá permaneceu até 1976 quando tragicamente ocorreu a sua morte, que segundo apurou a Comissão Nacional da Verdade uma morte que teve a participação de agentes da repressão, conforme depoimento de Cláudio António Guerra agente policial do Departamento da Ordem Político Social -DOPS do Estado do Espírito Santo, relatado no processo 237/96. Ela teve o carro fechado e jogado fora da pista, conforme confirmaram duas outras testemunhas oculares.
Sua vida de estilista, no Brasil foi sem sombra de dúvida de alguém pioneira da alta costura, que ganhou o Brasil e o mundo e conseguiu com a sua obra vestir atrizes, como Joan Crawford que estreou ao lado de Ramon navarro no filme Across to Singapore, conhecida também no filme alma em Suplicio. Outra atriz vestida por ela foi Kim Novarq que trabalhou com James Stewart no filme um corpo que cai de 1958. Assim como Lisa Minelli também vestida por Zuzu Angel a cantora e atriz conhecida por nós brasileiros no seu filme New York, New York e Cabaret e por fim Jean Shirimpton do filme The Gladiators ou Punishment Park de 1971.
No Brasil Zuzu teve uma loja em Ipanema. Como estilista foi pioneira em fazer uma moda original e genuinamente brasileira, com cores tropicais, usando pedras e fragmentos de bambu, madeiras e conchas, fitas de gorgorão, rendas do norte, chita, utilizando estampas de flores e borboletas.
Sua vida muda quando o seu filho Stuart Angel é preso e desaparece nas mão dos repressores brasileiros. Ele que era um estudante universitário, segundo o livro "Documentos dos Presos Políticos" acerca da repressão fascista no Brasil - Edições Maria da Forte, lançado em Lisboa -Portugal. preso em março de 1971 pelo CODI/Rio e consta é quase certo que foi torturado e morto dias após sua prisão. Foi visto vivo na Unidade militar da Guanabara, amarrado em um jeep que o arrastava pelo chão, teve o corpo todo esfolado, para que delatasse seus companheiros. Há depoimento judiciais de um preso político que foi testemunha ocular deste bárbaro fato. Depois disto nunca mais se soube do paradeiro de Stuart Edgar Angel Jones, e foram muitas as tentativas infrutíferas de advogados e familiares untos aos militares para localizá-lo, mesmo que fosse o corpo sem vida. E nesse caso Zuzu Angel denunciou a morte de seu filho e a denuncia nunca foi contestada pela ditadura fascista brasileira.
Após assumir a sua busca em relação ao seu filho, passou a enfrentar o regime militar. a sua luta era o direito de ter o corpo de seu filho vivo ou morto. A sua arte também teve reflexo desta procura ela passou a usar roupas em tons escuros e crucifixos, véu e um ano pendurado no pescoço. A sua coleção passou a ter estampas e silhuetas bélicas, pássaros engaiolados, balas de canhões, anos amordaçados, meninos aprisionados, sol atrás das grades e anos negros.
Alex Polares, amigo de Stuart Angel, escreveu para Zuzu relatando a tortura sofrida por sue filho. para quem não sabe Alex ficou preso dos 20 as 29 anos e ele que era da VPR - Vanguarda Popular revolucionária, de uma geração que viveu maio de 1968, o mito Chê Guevara, o sonho híppie, o amor e a liberdade sexual, teve um duro e profundo golpe com a repressão fascista civil e militar brasileira. Hoje Alex é um líder espiritual ele que foi a peça chave para o reconhecimento do Santo Daime como religião no Brasil. E vê uma urgência nos tempos de hoje para essa geração ele que tens a dizer que "O mundo só vai mudar quando a gente perceber que somos mais do que matéria. Somos luz".
A revolucionária Zuzu Angel, foi assassinada, por querer o seu filho de volta vivo ou morto. Ela não teve a felicidade de dar um beijo de despedida e enterrá-lo, e pro querer esse direito também foi vítima da ditadura civil e militar que se abateu no Brasil e foi assassinada, em 14 de abril de 1976, num suposto acidente, após sair da residência do compositor e poeta Chico Buarque de Holanda.
Em sua homenagem Chico Buarque compôs "Angélica" em 1977 uma letra sobre a melodia de Miltinho do MPB-4, E em 1988 o escritor José Louzeiro escreveu "em carne viva" um romance cuja a personagem lembra do drama de Zuzu Angel. Sua filha Hidelgard Angel criou o Instituto Zuzu Angel de Moda do Rio de Janeiro em memória da mãe. E Sérgio Rezende dirigiu o filme "Zuzu Angel", que teve a participação de artistas como Patrícia Pillar, Paulo Betti, Daniel de Oliveira, Luana Piovani entre outros.
Nunca soube que a cidade de Curvelo-MG, que foi berço de nascimento de Zuzu Angel, tenha fito qualquer homenagem a Zuzu Angel, mas ela nunca será esquecida em nossa história, mas eternizada nas obras artísticas e na sua luta, que restaura a busca da compreensão pela democracia e dignidade de um povo brasileiro que ainda luta e sofre com os fantasmas, das maldades, que atormentam a memória do Brasil. Estudar história com respeito e responsabilidade é uma necessidade básica, pra afugentar definitivamente esse mal físico e espiritual.
Manoel Messias Pereira
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